O agravo que permitia a eutanásia canina no âmbito dos Estados de Mato Grosso do Sul e São Paulo, foi banida, pois a decisão de primeiro grau que pontuou o seguintes: Assim, DEFIRO O PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA com o fim de desobrigar a autora a cumprir os preceitos da Portaria Ministerial nº 1.426, de 11 de julho de 2008, expedida pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e Ministério da Saúde e as Resoluções dos Conselhos Federal e Estadual de Veterinária que proíbe a administração de medicamento humano no tratamento de leishmaniose.", ou seja, está autorizado a aplicação de qualquer medicamento pelo Médico Veterinário, e foi mais além o Des. Relator pois o médico veterinário recebeu carta branca para tratar os animais, no âmbito da Terceira Região " .Dessa forma, merece prestígio a ação de veterinários realmente comprometidos com a profissão e que enfrentam a prepotência do Poder Público que até bem pouco tempo pretendia até invadir residências para apanhar cães doentes e mata-los contra a vontade dos donos.Não tem cabimento processar disciplinarmente e punir os veterinários que, enfrentando a prepotência e a ignorância estatal, cumprem os termos de seu juramento: juro no exercício da profissão de Médico Veterinário, doar meus conhecimentos em prol da salvação e do bem estar da vida, respeitando-a tal qual a vida humana e promovendo convívio leal e fraterno entre o homem e as demais espécies, num gesto sublime de respeito a Deus e a natureza"
DECISÃO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA - AUTOS N. 00035012820134036000
Vistos etc.Pretende a autora que seja reconhecida a inconstitucionalidade da Portaria Ministerial nº 1.426/2008, bem como do Decreto Federal nº 51.838/1963, com o fim de desobrigar os requerentes a cumprirem os preceitos da Portaria Ministerial nº 1.426, de 11 de julho de 2008, expedida pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e Ministério da Saúde e as Resoluções dos Conselhos Federal e Estadual de Veterinária que proíbe a administração de medicamento humano no tratamento de leishmaniose, porque extrapolam o poder normativo concedido.Decido.Trata-se de ação principal ajuizada após a obtenção de medida liminar nos autos da nº 0012031-94.403.6000, em razão do provimento de recurso interposto pela parte autora no TRF da 3ª Região. Transcrevo o voto condutor do acórdão:Apelação interposta por SOCIEDADE DE PROTEÇÃO E BEM ESTAR ANIMAL-ABRIGO DOS BICHOS (fls. 168/185) contra sentença que julgou improcedente a ação cautelar, ao fundamento de que não logrou a parte autora produzir a prova constitutiva de seu direito, até porque, não obstante se tratar de matéria fática, requereu o julgamento antecipado da lide (fls. 157/160).Aduz a necessidade de apreciação do mérito, à vista da farta documentação acostada com a exordial (fls. 27/69), especialmente as matérias jornalísticas que noticiaram os fatos, sob pena de afronta o artigo 330, I, do Código de Processo Civil e negativa de vigência do artigo 333, inciso I, do mesmo diploma legal. Sustenta, em síntese, a inaplicabilidade da Portaria Interministerial n.º 1.426, de 11 de julho de 2008-MAPA, que proíbe o tratamento da leishmaniose visceral em cães infectados com produtos de uso humano e recomenda e execução sumária de tais animais, em razão do que dispõem os artigos 5º, incisos II, IX, XIII e XXII, e 225, 1º, inciso VII, da Constituição Federal e a Lei n.º 9.605/98 combinada com o artigo 16, alíneas f e j, da Lei n.º 5.517/68. Alega que a portaria em questão institui imposições, exigências e condições não previstas taxativamente na lei e inviabiliza a livre pesquisa científica e o exercício da profissão veterinária, de modo a violar o princípio da legalidade.O Juiz Federal convocado David Diniz votou no sentido de negar provimento ao apelo por entender que a parte autora utilizou-se indevidamente do processo cautelar, em vez do de conhecimento, que se revela adequado para ampla dilação probatória que o caso dos autos reclama (fls. 211/214 v).Divirjo, todavia.Cinge-se a discussão à possibilidade ou não de a Portaria Interministerial n.º 1.426, de 11 de julho de 2008-MAPA proibir a utilização de produtos de uso humano ou não registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento para o tratamento de cães infectados pela leishmaniose visceral. Dispõe o referido ato:PORTARIA INTERMINISTERIAL Nº 1.426, DE 11 DE JULHO DE 2008Proíbe o tratamento da leishmaniose visceral canina com produtos de uso humano ou não registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. (grifei)O MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE E O MINISTRO DE ESTADO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO, no uso das atribuições que lhes confere o inciso II do parágrafo único do art. 87 da Constituição, e Considerando o Decreto-Lei Nº 51.838, de 14 de março de 1963, que dispõe sobre as normas técnicas especiais para o combate as leishmanioses no País;Considerando o Decreto-Lei Nº 467, de 13 de fevereiro de 1969, que dispõe sobre a fiscalização de produtos de uso veterinário, dos estabelecimentos que os fabricam e dá outras providências;Considerando o Decreto Nº 5.053, de 22 de abril de 2004, que aprova o regulamento de fiscalização de produtos de uso veterinário e dos estabelecimentos que os fabriquem ou comerciem, e dá outras providências;Considerando a Lei Nº 6.437, de 20 de agosto de 1977, que dispõe sobre infrações à legislação sanitária federal, estabelecendo as sanções;Considerando a Lei Nº 6.259, de 30 de outubro de 1975, que dispõe sobre as ações de vigilância epidemiológica;Considerando a Resolução No- 722, de 16 de agosto de 2002, que aprova o Código de Ética do Médico Veterinário e que revogou a Resolução Nº 322, de 15 de janeiro de 1981;Considerando o Informe Final da Consulta de expertos, Organização Pan-Americana da Saúde (OPS) Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre Leishmaniose Visceral em Las Américas, de 23 a 25 de novembro de 2005;Considerando o Relatório Final do Fórum de Leishmaniose Visceral Canina, de 9 a 10 de agosto de 2007;Considerando as normas do "Manual de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral" do Ministério da Saúde;Considerando que não há, até o momento, nenhum fármaco ou esquema terapêutico que garanta a eficácia do tratamento canino, bem como a redução do risco de transmissão;Considerando a existência de risco de cães em tratamento manterem-se como reservatórios e fonte de infecção para o vetor e que não há evidências científicas da redução ou interrupção da transmissão;Considerando a existência de risco de indução a seleção de cepas resistentes aos medicamentos disponíveis para o tratamento das leishmanioses em seres humanos; eConsiderando que não existem medidas de eficácia comprovada que garantam a não-infectividade do cão em tratamento, resolvem:Art. 1º - Proibir, em todo o território nacional, o tratamento da leishmaniose visceral em cães infectados ou doentes, com produtos de uso humano ou produtos não-registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). - grifeiArt. 2º - Definir, para efeitos desta Portaria, os seguintes termos:I - risco à saúde humana: probabilidade de um indivíduo vir a desenvolver um evento deletério de saúde (doença, morte ou seqüelas), em um determinado período de tempo;II - caso canino confirmado de leishmaniose visceral por critério laboratorial: cão com manifestações clínicas compatíveis com leishmaniose visceral e que apresente teste sorológico reagente ou exame parasitológico positivo;III - caso canino confirmado de leishmaniose visceral por critério clínico-epidemiológico: todo cão proveniente de áreas endêmicas ou onde esteja ocorrendo surto e que apresente quadro clínico compatível de leishmaniose visceral, sem a confirmação do diagnóstico laboratorial;IV - cão infectado: todo cão assintomático com sorologia reagente ou parasitológico positivo em município com transmissão confirmada, ou procedente de área endêmica. Em áreas sem transmissão de leishmaniose visceral é necessária a confirmação parasitológica; eV - reservatório canino: animal com exame laboratorial parasitológico positivo ou sorologia reagente, independentemente de apresentar ou não quadro clínico aparente.Art. 3º - Para a obtenção do registro, no MAPA, de produto de uso veterinário para tratamento de leishmaniose visceral canina, o interessado deverá observar, além dos previstos na legislação vigente, os seguintes requisitos:I - realização de ensaios clínicos controlados, após a autorização do MAPA; eII - aprovação do relatório de conclusão dos ensaios clínicos mediante nota técnica conjunta elaborada pelo MAPA e o Ministério da Saúde (MS). 1º O pedido de autorização para realização de ensaios clínicos controlados deve estar acompanhado do seu Protocolo. 2º Os ensaios clínicos controlados devem utilizar, preferencialmente, drogas não destinadas ao tratamento de seres humanos. 3º A autorização do MAPA vincula-se à nota técnica conjunta elaborada pelo MAPA e o MS.Art. 4º - A importação de matérias-primas para pesquisa, desenvolvimento ou fabricação de medicamentos para tratamento de leishmaniose visceral canina deverá ser solicitada previamente ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, devendo a mesma estar acompanhada do protocolo de estudo e respectivas notas do artigo anterior.Art. 5º - Ao infrator das disposições desta Portaria aplica-se:I - quando for médico veterinário, as infrações e penalidades do Código de Ética Profissional do Médico Veterinário;II - o art. 268 do Código Penal; eIII - as infrações e penalidades previstas na Lei No- 6.437, de 20 de agosto de 1977, e no Decreto-Lei No- 467, de 13 de fevereiro de 1969.Art. 6º - O MS e o MAPA deverão adotar as medidas necessárias ao cumprimento efetivo do disposto nesta Portaria.Art. 7º - As omissões e dúvidas por parte dos agentes públicos cujas funções estejam direta ou indiretamente relacionadas às ações de controle da leishmaniose visceral, na aplicação do disposto nesta Portaria serão apreciadas e dirimidas pela Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS) e pela Secretaria de Defesa Agropecuária (SDA/ MAPA).Art. 8º - Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.De início, destaque-se que a questão sob análise é eminentemente de direito, diferentemente do que decidiu o juiz de primeiro grau, porquanto o autor questiona tanto a legalidade quanto a constitucionalidade da Portaria n.º 1.426. Assim, por se tratar de matéria de lei, não é pertinente, data venia do ilustre relator, a discussão acerca da possibilidade ou não de produção de provas em sede de cautelar.Entendo que a Portaria n.º 1.426 é ilegal, porquanto extrapola os limites tanto da legislação que regulamenta a garantia do livre exercício da profissão de médico veterinário, como das leis protetivas do meio ambiente, em especial da fauna.No tocante ao exercício profissional, a Lei n.º 5.517/68 ressalta, dentre as atribuições do veterinário, a prática da clínica em todas as suas modalidades, a assistência técnica e sanitária aos animais sob qualquer forma, o planejamento e a execução da defesa sanitária animal, o estudo e a aplicação de medidas de saúde pública no tocante às doenças de animais transmissíveis ao homem e as pesquisas e trabalhos ligados à biologia geral, à zoologia, à zootecnia bem como à bromatologia animal em especial, consoante se observa dos artigos 1º, 5º, alíneas a, c e d, e 6º, alíneas b e h, verbis: Art. 1º O exercício da profissão de médico-veterinário obedecerá às disposições da presente lei. (...) Art. 5º É da competência privativa do médico veterinário o exercício das seguintes atividades e funções a cargo da União, dos Estados, dos Municípios, dos Territórios Federais, entidades autárquicas, paraestatais e de economia mista e particulares: a) a prática da clínica em todas as suas modalidades; (...); c) a assistência técnica e sanitária aos animais sob qualquer forma; d) o planejamento e a execução da defesa sanitária animal; (...) Art. 6º Constitui, ainda, competência do médico-veterinário o exercício de atividades ou funções públicas e particulares, relacionadas com: (...) b) o estudo e a aplicação de medidas de saúde pública no tocante às doenças de animais transmissíveis ao homem; (...) h) as pesquisas e trabalhos ligados à biologia geral, à zoologia, à zootecnia bem como à bromatologia animal em especial; (...) A mesma lei, que igualmente cria os Conselhos Federal e Regionais de Medicina Veterinária, consigna dentre as atribuições do CFMV, a expedição de resoluções para sua fiel execução e a organização do respectivo Código de Ética: Art 16. São atribuições do CFMV: (...)f) expedir as resoluções que se tornarem necessárias à fiel interpretação e execução da presente lei; (...) j) organizar o Código de Deontologia Médico-Veterinária. Com base no mencionado artigo 16 Lei n.º 5.517/68 é que foi editado o Código de ética do Médico Veterinário, consubstanciado na Resolução n.º 722, de 16 de agosto de 2002, cujo artigo 10 preceitua a liberdade do veterinário na prescrição do tratamento que considerar mais indicado, incluídos os recursos humanos e materiais que entender necessários ao desempenho da profissão:Art. 10. Prescrever tratamento que considere mais indicado, bem como utilizar os recursos humanos e materiais que julgar necessários ao desempenho de suas atividades. Resta claro, com base no aludido arcabouço normativo, que ao veterinário é que cabe decidir acerca da prescrição do tratamento aos animais, bem como quanto aos recursos humanos e materiais a serem empregados. A portaria, ao vedar a ut ilização de produtos de uso humano ou não registrados no competente órgão federal, viola os referidos preceitos legais e, por consequência, indiretamente, a liberdade de exercício da profissão, prevista no inciso XIII do artigo 5º da Constituição Federal (XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer), assim como o princípio da legalidade, que conta do inciso II (II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei).A Portaria n.º 1.426 revela-se ilegal, ainda, por afrontar a legislação protetiva do meio ambiente, especialmente a Lei n.º 9.605/98, que tipifica, dentre os crimes ambientais, aqueles que são cometidos contra a fauna, e também a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, proclamada em assembléia da Unesco, em Bruxelas, no dia 27 de janeiro de 1978, que regulamenta a matéria no âmbito internacional, e que foi recepcionada pelo nosso sistema jurídico:Artigo1º Todos os animais nascem iguais diante da vida, e têm o mesmo direito à existência.Artigo2ºa) Cada animal tem direito ao respeitob) O homem, enquanto espécie animal, não pode atribuir-se o direito de exterminar os outros animais, ou explorá-los, violando esse direito. Ele tem o dever de colocar a sua consciência a serviço dos outros animais;c) Cada animal tem direito à consideração, à cura e à proteção do homem.Artigo3ºa) Nenhum animal será submetido a maus tratos e a atos cruéis; b) Se a morte de um animal é necessária, deve ser instantânea, sem dor ou angústia. (grifei)Artigo 4ºa) Cada animal que pertence a uma espécie selvagem tem o direito de viver livre no seu ambiente natural terrestre, aéreo e aquático, e tem o direito de reproduzir-se;b) A privação da liberdade, ainda que para fins educativos, é contrária a este direito.Artigo 5ºa) Cada animal pertencente a uma espécie, que vive habitualmente no ambiente do homem, tem o direito de viver e crescer segundo o ritmo e as condições de vida e de liberdade que são próprias de sua espécie;b) Toda a modificação imposta pelo homem para fins mercantis é contrária a esse direito. Artigo 6ºa) Cada animal que o homem escolher para companheiro tem o direito a uma duração de vida conforme sua longevidade natural; b) O abandono de um animal é um ato cruel e degradante. Artigo 7ºCada animal que trabalha tem o direito a uma razoável limitação do tempo e intensidade do trabalho, a uma alimentação adequada e ao repouso.Artigo 8ºa) A experimentação animal, que implica em sofrimento físico, é incompatível com os direitos do animal, quer seja uma experiência médica, científica, comercial ou qualquer outra; b) As técnicas substitutivas devem ser utilizadas e desenvolvidas.Artigo 9ºNenhum animal deve ser criado para servir de alimentação, ser nutrido, alojado, transportado e abatido, quando, para isso, tenha que passar por ansiedade ou dor. Artigo 10Nenhum animal deve ser usado para divertimento do homem. A exibição dos animais e os espetáculos que utilizem animais são incompatíveis com a dignidade do animal. Artigo 11O ato que leva à morte de um animal sem necessidade é um biocídio, ou seja, um crime contra a vida. Artigo 12a) Cada ato que leve à morte um grande número de animais selvagens é genocídio, ou seja, um delito contra a espécie; b) O aniquilamento e a destruição do meio ambiente natural levam ao genocídio. Artigo 13a) O animal morto deve ser tratado com respeito; b) As cenas de violência de que os animais são vítimas, devem ser proibidas no cinema e na televisão, a menos que tenham como fim mostrar um atentado aos direitos dos animais.Artigo14a) As associações de proteção e de salvaguarda dos animais devem ser representadas a nível de governo;b) Os direitos dos animais devem ser defendidos por leis, como os direitos dos homens.Destaque-se que a proteção dos animais em relação às práticas que possam provocar sua extinção ou que os submetam à crueldade é decorrência do direito da pessoa humana ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, previsto no inciso VII do 1º do artigo 225 do texto constitucional, verbis:Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:(...)VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. A Constituição Federal, a Declaração de Bruxelas e as leis de proteção à fauna conduzem-se no sentido da proteção tanto da vida como contra os maus tratos. A vedação de medicamentos usados para humanos ou dos não registrados para aliviar ou evitar a doença em causa, desde que prescritos por quem de direito, representa séria violação e desrespeito aos estatutos mencionados. Os seres vivos, de maneira geral, e os animais em particular, juntamente com os demais elementos que compõem a eco esfera, constituem o planeta Terra. Nada mais é que um organismo vivo, que depende para sua existência da relação equilibrada da fauna, da flora, das águas dos mares e dos rios e do ar. Somente tal compreensão pode garantir a existência das gerações futuras. Disso decorre a responsabilidade que cada um tem com o meio-ambiente. Pouco apreço pela vida ou por aquilo que a pressupõe significa descomprometimento com o futuro. Sabemos como reproduzir a vida, não como a criar efetivamente. Aquele que desmerece os seres com os quais tudo tem sentido atinge nossa identidade e perdeu ou não adquiriu a essência do que se chama humano. Por isso, é muito grave a edição da portaria de que se cuida nos autos. Produz a concepção de que os seres humanos desconsideram o cuidado necessário ecológico pelo qual somos responsáveis.Por fim, não prospera a alegação de inconstitucionalidade da portaria em questão. Alega a apelante que: a norma infraconstitucional que extrapolar os limites da lei deve ser tida por ilegal ou quando não houver lei sobre o tema tratado pela norma infralegal a sua atuação na lacuna da lei gera inconstitucionalidade por afrontar ao princípio da legalidade (art. 5º, inc. II, CF) - fl. 181. Ocorre que, consoante já demonstrado, a matéria é sim objeto de lei e eventual afronta à Constituição Federal seria apenas reflexa.Honorários em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, em razão da estimativa deste na petição inicial (R$ 1.500,00), da peculiaridade da controvérsia e do trabalho desenvolvido pelo advogado. Custas ex vi legis. Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação, para julgar procedente a ação e reconhecer a inaplicabilidade da vedação contida no artigo 1º da Portaria Interministerial n.º 1.426, de 11 de julho de 2008-MAPA. Honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa. Custas ex vi
legis.Comfundamento nessa medida cautelar, entendo haver verossimilhança nas alegações da parte autora.Assim, DEFIRO O PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA com o fim de desobrigar a autora a cumprir os preceitos da Portaria Ministerial nº 1.426, de 11 de julho de 2008, expedida pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e Ministério da Saúde e as Resoluções dos Conselhos Federal e Estadual de Veterinária que proíbe a administração de medicamento humano no tratamento de leishmaniose.Retifiquem-se os registros para excluir do polo passivo o Ministério da Agricultura e Abastecimento e o Ministério da Saúde, que não possuem personalidade jurídica e já estão presentados pela União. Intime-se a autora para recolhimento das custas iniciais. Comprovado o pagamento, cite-se e intime-se a ré. Após, oficie-se ao Desembargador Relator da ação cautelar, noticiando a propositura desta ação no dia 11/04/2013, juntando cópia desta decisão.Campo Grande, MS, 16 de abril de 2013.JANIO ROBERTO DOS SANTOSJuiz Federal Substituto
Disponibilização D.Eletrônico de decisão em 22/04/2013 ,pag 0
DECISÃO
Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pela UNIÃO FEDERAL em 22.07.2013, contra decisão que deferiu o pedido de tutela antecipada nos autos originários, a fim de desobrigar a parte autora, ora agravada, a cumprir os preceitos da Portaria Ministerial nº 1.426, de 11 de julho de 2008, expedida pelo Ministério da Agricultura, Pecuária, e Abastecimento e Ministério da Saúde e Resoluções dos Conselhos Federal e Estadual de Veterinária, que proíbe a utilização de medicamento humano no tratamento de leishmaniose.
Sustenta a agravante, em síntese, a nulidade da decisão agravada uma vez que suspendeu a eficácia de ato praticado por quem não é parte do processo. Alega também que referida decisão é suscetível de causar lesão grave à saúde pública de forma irreparável, isso porque tem sido verificado um aumento da resistência primária do parasita leishmania às poucas drogas disponíveis para tratamento humano da leishmaniose visceral (LV).
Aduz ainda que o tratamento canino da leishmaniose visceral propicia a disseminação parasitária no ambiente social urbano, tendo sido verificado uma baixíssima eficácia desse tratamento no controle da doença. Afirma que vem ocorrendo uma grande expansão e urbanização da doença no Estado do Mato Grosso do Sul, o que certamente irá se agravar com a o aumento da resistência do parasita.
Defende também a legalidade da Portaria Federal que o proíbe a utilização de medicamento humano no tratamento de leishmaniose para cães, visto que tal norma encontra-se amparada pelo artigo 200, incisos I e II, da Constituição Federal, bem como pela legislação sanitária federal. Por tudo isso, requer a concessão de efeito suspensivo, e, ao final, o provimento do presente agravo, para que seja revogada a liminar concedida nos autos originários.
Pedido de efeito suspensivo parcialmente concedido para permitir a utilização da Portaria 1426/2008, desde que a eventual eutanásia canina a ser praticada seja precedida da realização dos dois testes acima mencionados e também antecedida de criteriosa avaliação do Médico-Veterinário pertencente aos quadros públicos (fls. 848/850).
Embargos de declaração opostos pela Sociedade de Proteção e Bem Estar Animal - Abrigo dos Bichos (fls. 852/889).
Manifestação da União às fls. 902/924.
Reconhecida a continência entre os presentes autos e os do agravo de instrumento nº 0013792-50.2010.4.03.0000, houve a redistribuição do recurso por dependência a esse Relator.
Informações prestadas pelo MM. Juízo a quo às fls. 953/954.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório.
Decido.
Tendo em vista a redistribuição do presente recurso, revejo a decisão anteriormente proferida às fls. 848/850.
O agravo de instrumento foi interposto contra decisão que deferiu o pedido de tutela antecipada nos autos originários, a fim de desobrigar a parte autora, ora agravada, a cumprir os preceitos da Portaria Ministerial nº 1.426, de 11 de julho de 2008, expedida pelo Ministério da Agricultura, Pecuária, e Abastecimento e Ministério da Saúde e Resoluções dos Conselhos Federal e Estadual de Veterinária, que proíbe a utilização de medicamento humano no tratamento de leishmaniose.
Observo que a questão já foi decidida em sede do agravo de instrumento nº 0002549-02.2016.4.03.0000, nos seguintes termos (transcrição parcial):
"O sacrifício indiscriminado de cães, animais obviamente inocentes, afetados pela Leishmaniose Visceral Canina, é uma das indecências que o ser humano comete em "nome" de uma suposta preocupação com a saúde pública, quando se sabe que existem tratamentos que podem acabar com os sinais clínicos e epidemiológicos dessa zoonose, da qual o pobre animal é apenas um dos vetores (a raposa, o cavalo e os seres humanos são outros, mas ninguém pensa, ainda e felizmente, em exterminá-los...) da moléstia que é transmitida por meio da picada de um mosquito infectado por um protozoário; na verdade a CAUSA maior dessa zoonose é a incúria, o descaso, a incompetência do próprio Poder Público em erradicar as áreas de sujeira que infestam nossas cidades - em detrimento das populações mais pobres - , sendo que o Poder Público tenta "disfarçar" sua inépcia no setor do saneamento básico autorizando e acoroçoando o holocausto dos pobre animais que são apenas vítimas da doença.
(.....)
Na verdade a equivocada portaria já foi considerada inválida por esta Corte Regional, como segue:
PORTARIA INTERMINISTERIAL Nº 1.426 - MAPA. CÃES INFECTADOS PELA LEISHMANIOSE VISCERAL. PROIBIÇÃO DA UTILIZAÇÃO DE PRODUTOS DE USO HUMANO OU NÃO REGISTRADOS NO MAPA. QUESTÃO DE DIREITO. ILEGALIDADE. LIVRE EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE VETERINÁRIO. LEI N.º 5.517/68. ARTIGOS 1º, 5º, ALÍNEAS A, C E D, E 6º, ALÍNEAS B E H. ARTIGO 16 LEI N.º 5.517/68. CÓDIGO DE ÉTICA DO MÉDICO VETERINÁRIO. ARTIGO 10 DA RESOLUÇÃO N.º 722/2002. DECISÃO ACERCA DA PRESCRIÇÃO DO TRATAMENTO AOS ANIMAIS E RECURSOS HUMANOS E MATERIAIS A SEREM EMPREGADOS. PRERROGATIVA DO VETERINÁRIO. AFRONTA À LEGISLAÇÃO PROTETIVA DO MEIO AMBIENTE. LEI N.º 9.605/98. CRIMES CONTRA A FAUNA. DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DOS ANIMAIS. INCONSTITUCIONALIDADE. REFLEXA. HONORÁRIOS. APELAÇÃO PROVIDA. 1. Cinge-se a discussão à possibilidade ou não de a Portaria Interministerial n.º 1.426, de 11 de julho de 2008-MAPA proibir a utilização de produtos de uso humano ou não registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento para o tratamento de cães infectados pela leishmaniose visceral. 2. A questão sob análise é eminentemente de direito, diferentemente do que decidiu o juiz de primeiro grau, porquanto o autor questiona tanto a legalidade quanto a constitucionalidade da Portaria n.º 1.426. Assim, por se tratar de matéria de lei, não é pertinente, data venia do ilustre relator, a discussão acerca da possibilidade ou não de produção de provas em sede de cautelar. 3. A Portaria n.º 1.426 é ilegal, porquanto extrapola os limites tanto da legislação que regulamenta a garantia do livre exercício da profissão de médico veterinário, como das leis protetivas do meio ambiente, em especial da fauna. 4. No tocante ao exercício profissional, a Lei n.º 5.517/68 ressalta, dentre as atribuições do veterinário, a prática da clínica em todas as suas modalidades, a assistência técnica e sanitária aos animais sob qualquer forma, o planejamento e a execução da defesa sanitária animal, o estudo e a aplicação de medidas de saúde pública no tocante às doenças de animais transmissíveis ao homem e as pesquisas e trabalhos ligados à biologia geral, à zoologia, à zootecnia bem como à bromatologia animal em especial, consoante se observa dos artigos 1º, 5º, alíneas a, c e d, e 6º, alíneas b e h. A mesma lei, que igualmente cria os Conselhos Federal e Regionais de Medicina veterinária , consigna dentre as atribuições do CFMV, a expedição de resoluções para sua fiel execução e a organização do respectivo Código de Ética. Com base no mencionado artigo 16 Lei n.º 5.517/68 é que foi editado o Código de ética do Médico Veterinário, consubstanciado na Resolução n.º 722, de 16 de agosto de 2002, cujo artigo 10 preceitua a liberdade do veterinário na prescrição do tratamento que considerar mais indicado, incluídos os recursos humanos e materiais que entender necessários ao desempenho da profissão. 5. Resta claro, com base no aludido arcabouço normativo, que ao veterinário é que cabe decidir acerca da prescrição do tratamento aos animais, bem como quanto aos recursos humanos e materiais a serem empregados. A portaria, ao vedar a utilização de produtos de uso humano ou não registrados no competente órgão federal, viola os referidos preceitos legais e, por consequência, indiretamente, a liberdade de exercício da profissão, prevista no inciso XIII do artigo 5º da Constituição Federal, assim como o princípio da legalidade, que conta do inciso II. 6. A Portaria n.º 1.426 revela-se ilegal, ainda, por afrontar a legislação protetiva do meio ambiente, especialmente a Lei n.º 9.605/98, que tipifica, dentre os crimes ambientais, aqueles que são cometidos contra a fauna, e também a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, proclamada em assembléia da Unesco, em Bruxelas, no dia 27 de janeiro de 1978, que regulamenta a matéria no âmbito internacional, e que foi recepcionada pelo nosso sistema jurídico. 7. A proteção dos animais em relação às práticas que possam provocar sua extinção ou que os submetam à crueldade é decorrência do direito da pessoa humana ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, previsto no inciso VII do § 1º do artigo 225 do texto constitucional. 8. A Constituição Federal, a Declaração de Bruxelas e as leis de proteção a fauna conduzem-se no sentido da proteção tanto da vida como contra os maus tratos. A vedação de medicamentos usados para humanos ou dos não registrados para aliviar ou evitar a doença em causa, desde que prescritos por quem de direito, representa séria violação e desrespeito aos estatutos mencionados. Os seres vivos, de maneira geral, e os animais em particular, juntamente com os demais elementos que compõem a eco esfera, constituem o planeta Terra. Nada mais é que um organismo vivo, que depende para sua existência da relação equilibrada da fauna, da flora, das águas dos mares e dos rios e do ar. Somente tal compreensão pode garantir a existência das gerações futuras. Disso decorre a responsabilidade que cada um tem com o meio-ambiente. Pouco apreço pela vida ou por aquilo que a pressupõe significa descomprometimento com o futuro. Sabemos como reproduzir a vida, não como a criar efetivamente. Aquele que desmerece os seres com os quais tudo tem sentido atinge nossa identidade e perdeu ou não adquiriu a essência do que se chama humano. Por isso, é muito grave a edição da portaria de que se cuida nos autos. Produz a concepção de que os seres humanos desconsideram o cuidado necessário ecológico pelo qual somos responsáveis. 9. Por fim, não prospera a alegação de inconstitucionalidade da portaria em questão. Consoante já demonstrado, a matéria é sim objeto de lei e eventual afronta à Constituição Federal seria apenas reflexa. 10. Honorários em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa em razão da estimativa desta na petição inicial (R$ 1.500,00), da peculiaridade da controvérsia e do trabalho desenvolvido pelo advogado. Custas ex vi legis. 11. Apelação provida.
(TRF-3 - AC: 12031 MS 0012031-94.2008.4.03.6000, Relator: JUIZ CONVOCADO DAVID DINIZ, Data de Julgamento: 13/09/2012, QUARTA TURMA, Relator p/ acórdão Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE )
Ainda recentemente, em decisão unânime a 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) seguiu voto do relator, Desembargador Francisco Vildon J. Valente, a fim de manter inalterada a sentença proferida pelo juiz Jeronymo Pedro Villas Boas, da 1ª Vara da Fazenda Pública Municipal e Registros Públicos de Goiânia. A decisão negou a ação ordinária com pedido de medida cautelar, feita pelo Município de Goiânia, para que seja realizada eutanásia em cachorro supostamente infectado com a doença leishmaniose.
Ao Ministério da Saúde brasileiro, cujas próprias deficiências são notórias e inescondíveis, repugna o tratamento dos cães com medicamentos que são eficazes, afirmando que isso inibiria a eficácia do remédio no tratamento dos humanos infectados, ao que se opõem estudiosos e ONGs de proteção aos animais. Para os sábios do Ministério da Saúde, matar é melhor do que tratar, e o ministério continua ignorando que o verdadeiro vetor da moléstia é uma espécie de mosquito, nome científico flebótomo do gênero Lutzomyia, conhecido como mosquito palha, tatuquira, asa branca, cangalinha, asa dura, palhinha ou birigui; é fêmea da espécie que transmite a moléstia. Esses insetos - que vivem em áreas úmidas e contaminadas - por serem muito pequenos são capazes de atravessar mosquiteiros e telas.
Então, é mais fácil matar os cães - facilmente encontráveis, laçáveis e sacrificáveis - do que investir o dinheiro público (cuja "farra" feita pelos ímprobos de vários matizes com tais recursos no Brasil, já é de conhecimento mundial) no saneamento público.
Na verdade os burocratas do Ministério da Saúde esqueceram que deve ser aplicada a Lei 5.517/68 e o Código de Ética do Conselho Federal de Medicina veterinária que registra como exclusiva a competência do Médico Veterinário para o diagnóstico de doenças em animais e autonomia para prescrever tratamentos ou outras medidas que visem garantir a vida e o bem-estar animal.
Os medicamentos usados contra os sintomas da doença são, de regra, Alopurinol, Cetoconazol, Levamizol, Vitamina A, Zinco, Aspartato de L-arginina e Prednisona. Além disso, trabalhos científicos respeitáveis apontam como métodos efetivos de controle da doença o uso regular de coleiras e produtos inseticidas nos cães e o desenvolvimento de vacinas, não sendo, de modo algum, recomendada a eutanásia como método de controle.
Mas o Poder Público deseja o sacrifício dos animais - especialmente os caninos errantes, sem dono e por isso indefesos - ao invés de investir numa política pública de erradicação, pelo menos nos centros urbanos, das áreas que servem de criadouro para o mosquito Lutzomyia. Melhor matar os cães, pensa o Governo Federal.
Dessa forma, merece prestígio a ação de veterinários realmente comprometidos com a profissão e que enfrentam a prepotência do Poder Público que até bem pouco tempo pretendia até invadir residências para apanhar cães doentes e mata-los contra a vontade dos donos.
Não tem cabimento processar disciplinarmente e punir os veterinários que, enfrentando a prepotência e a ignorância estatal, cumprem os termos de seu juramento: juro no exercício da profissão de Médico Veterinário, doar meus conhecimentos em prol da salvação e do bem estar da vida, respeitando-a tal qual a vida humana e promovendo convívio leal e fraterno entre o homem e as demais espécies, num gesto sublime de respeito a Deus e a natureza".
Ora, a Portaria Ministerial nº 1.426, de 11 de julho de 2008 já foi considerada inválida no âmbito desta 3ª Região, mas no Estado do Mato Grosso do Sul parece que a União Federal não atende a decisão judicial proferida na AC: 12031 MS 0012031-94.2008.4.03.6000 votada pela 4ª Turma desta Corte, muito embora esse aresto tenha sido proferido em processo oriundo da 4ª Vara Federal de Campo Grande/MS.
Pelo exposto, revendo a decisão de fls. 848/850, INDEFIRO o efeito suspensivo pleiteado, restando prejudicados os embargos de declaração de fls. 852/889.
Comunique-se.
Int.
São Paulo, 23 de maio de 2016.
Johonsom di Salvo
Desembargador Federal